Distraída, prendi o dedo mindinho na gaveta.
E nem doeu na hora…
A dor veio aos pouquinhos, fraca, lenta, até que doía tanto que era quase impossível não maldizer o mundo, com olhos lacrimejantes em decorrência de um dedo ferido.
E como eu odiei aquela gaveta, aquele carpinteiro, o espaço pequeno que havia para eu me mover, o tamanho e a cor da gaveta. Como eu odiei aquela e todas as outras gavetas do mundo.
Para que gavetas? Queria um armário com portas gigantes, fechos de segurança, puxadores prateados, queria outro carpinteiro, queria outro espaço pra me mover.
Então, reclamando do mundo e sem poder usar violência para retirar a gaveta do lugar, fui até o sofá da sala, segurando o dedo mindinho com a outra mão, a cara amarrada, a dor latente e mil insultos mentais para a tal gaveta…
Aos poucos a dor foi passando.
A dor foi, a gaveta ficou. E o dedo também.
Ambos dividem pacificamente o mesmo espaço. Antes tivera feito tudo com menos pressa, com mais cuidado. Saberia que a culpa não era só da gaveta, a culpa também era minha.